Historia

    Altura é uma pequena povoação à beira-mar, com uma população de 3.200 habitantes (aproximadamente), mas que, na época de Verão, atinge 12 a 14 mil.

            Não havia nenhum lugar de culto para que os católicos desta povoação pudessem celebrar a sua fé. Isso só era possível numa povoação que dista cerca de quatro quilómetros - S. Bartolomeu - onde todos se deslocavam para o fazer, quase sempre e apenas, quando ocorria a morte de algum familiar ou amigo. O percurso era a pé, pois não havia transportes para lá. Mesmo assim, ali também não havia habitualmente a celebração da missa dominical.

            Existia, por isso, uma grande aspiração dos católicos desta localidade em poder praticar o seu dever de cristãos. Havia a necessidade de criar um espaço próprio, para o poder fazer.

            No ano de 1994, foi substituído o sacerdote do concelho, Rev. Padre António Henriques que, pela idade avançada, teve de se retirar. Para ocupar o seu lugar na paróquia, foi nomeado um sacerdote mais jovem, o Rev. Padre Carlos Silva, que passou a celebrar a Eucaristia em São Bartolomeu.

Foi nesta localidade que ele apelou, no final da missa, para que se estivesse presente alguém de Altura gostaria de falar-lhe. Estando eu presente e terminada a missa senti-me no dever de me dirigir ao sacerdote para oferecer os meus préstimos.

Nesse dia perguntou-me o que tínhamos em Altura sobre a prática cristã, respondi-lhe que nada tínhamos. Manifestou o Padre Carlos, desde logo, a vontade de iniciar este trabalho e, como não podia deixar de ser, ofereci-me de imediato para colaborar e para tentar arranjar um espaço que permitisse realizar este sonho dos Alturenses do qual eu também partilhava.

            Logo no dia seguinte, consegui um espaço. Foi com muita alegria e nervosismo, que preparei, juntamente com algumas irmãs, (algumas já falecidas) tudo para que este lugar tivesse a dignidade para celebrar Jesus Ressuscitado. Tudo se tornou mais difícil, porque a vivencia cristã era muito pouca e sabíamos que era um momento especial, mas fomos pedindo uma toalha branca emprestada, uns vasos de plantas, uma jarra com flores... conseguimos preparar o espaço com a dignidade que aquele acto bem merecia.

 Foi num espaço, onde mais tarde funcionou um supermercado, que no dia 25 de Dezembro de 1995, com a presença de elevado número de fiéis, realizou-se pela primeira Eucaristia em Altura. No entanto, porque o proprietário precisou do espaço, não foi possível continuar a celebrar ali. Esta primeira missa foi celebrada pelo Rev. Padre Carlos e pelo actual Bispo do Algarve, D. Manuel Neto Quintas que, então, era superior Padre Provincial.

              O dia foi de muita alegria para todos, no entanto misturava-se a tristeza, pois aquele espaço só nos foi cedido para aquela celebração.

Apesar das dificuldades não parámos! Tentámos arranjar outro espaço para dar continuidade à celebração da Eucaristia e outras práticas religiosas. Logo um outro habitante desta população, o Senhor Amador, disponibilizou uma pequena garagem onde cabiam cerca de 35 pessoas.  

            Nesta garagem, podemos dizer, teve inicio a prática do culto em Altura. No primeiro dia eram dezasseis pessoas, nem sabíamos responder à missa, mas depressa aprendemos. Logo a seguir um grupo tomou a iniciativa de, uma vez por semana, à noite, juntar-se para rezar. Em1996 aqui iniciamos o Grupo de Renovamento Carismático Católico. Embora o nosso Pároco fosse o P. Carlos Silva, estiveram para o ajudar os senhores padres Macedo e Rafael, sacerdotes do SCJ.

             Passados alguns meses, já não havia espaço, dentro da garagem, para as pessoas participar na missa. Muitas pessoas participavam na eucaristia fora da porta ou através da janela.

             Porque se aproximava a época de Inverno, houve, novamente, necessidade de arranjar um espaço maior. Mudámos para um antigo barracão de cinema, (em frente à garagem), propriedade do mesmo senhor. Este barracão foi adaptado para a nossa liturgia. Ali havia espaço para 150 pessoas (aproximadamente), embora sem grandes condições: chovia no Inverno, fazia um calor abrasador no Verão (parte do salão tinha tecto de

em chapa, a outra metade nem tinha tecto), as osgas passavam durante a missa, os ratos roíam os paramentos, as andorinhas faziam os seus ninhos. No Inverno aquele espaço, por vezes, ficava todo inundado, com água até cobrir as cadeiras… por isso havia Domingos em que era impossível celebrar a Eucaristia.

            Com a contribuição da comunidade adquirimos uma imagem de “Imaculado Coração de Maria”, foi improvisado um nicho onde por baixo, foi colocado o sacrário.

            Lembro uma manhã em que, depois de ter chovido torrencialmente durante toda a noite, fui ao salão. A água da chuva tinha subido quase um metro de altura, estava mesmo a entrar no sacrário, colocado na parte inferior do nicho onde estava colocada a imagem de Nossa Senhora. Liguei ao Senhor Padre para lhe dar conhecimento do facto. Ele pediu-me que retirasse as partículas consagradas, pois a água não parava de subir.

           

Apesar das condições éramos uma comunidade muito alegre, cada um trazia o que podia: cadeiras, cortinados e outros objectos necessários para permitir melhores condições para a Eucaristia.

Todos reconhecíamos que as condições não eram as melhores, mas vivemos ali momentos espirituais muito ricos do amor de Deus, algumas das nossas crianças receberam ali o Baptismo e fizeram a sua Primeira Comunhão.

            Tivemos também a presença de sacerdotes bem conhecidos como Padre Vítor Melícias e outros que habitualmente passam férias entre nós e que aqui celebravam Eucaristia.

            Embora com poucos conhecimentos, a nossa entrega à vontade de Deus foi de coração aberto, e a nossa comunidade depressa cresceu, era muito alegre e unida, iniciámos as catequeses para crianças. No inicio tínhamos a frequência de 90 crianças e fomos crescendo no amor e na graça do Senhor.

            No ano de 1998, com a aprovação do Senhor Bispo, D. Manuel Madureira Dias, foi escolhido o orágo da futura Igreja, que seria dedicada ao “Coração Imaculado de Maria”.

            Também, nesse mesmo ano, em Junho, foi realizada a primeira Procissão em honra da Nossa Padroeira, que teve lugar no segundo sábado depois do Domingo da Santíssima Trindade, dia que o calendário litúrgico dedica ao “Coração Imaculado de Maria”.

            Porque, com a confiança em Jesus Cristo tudo é possível, as dificuldades não fizeram desanimar os cristãos desta terra, e começaram desde logo, a reunir esforços para a construção da Igreja.

            Promovemos várias iniciativas para angariação de fundos: venda de calendários com a maqueta daquela que viria a ser a nossa igreja, porta-chaves com a imagem da nossa Padroeira, tijolos minis, rifas com objectos oferecidos, um bazar, enfim, tudo o que entendíamos que podia ajudar a alcançar o nosso desejo: uma digna igreja em honra do Imaculado Coração de Maria.

            Em 1999 foi apresentado o projecto da igreja na Câmara Municipal.

            Apesar da nossa caminhada estar a seguir a bom ritmo, quiseram os desígnios do Senhor, que o Padre Carlos fosse transferido e veio substitui-lo (em Outubro de 2001), para guiar esta comunidade, o Rev. Padre Marcelino que continuou a promover esforços para a construção da nova igreja.

           

E continuámos a nossa caminhada com o desejo de ver a nossa igreja construída, conscientes de que a igreja éramos nós,  mas que ter um templo digno do Senhor também era importante.

E continuámos a nossa caminhada …

O projecto estava em fase de aprovação na Câmara Municipal, tínhamos o terreno que tinha sido doado por uma religiosa, a Ir. Maria da Glória, natural de Altura. A Rua da Freira, em Altura, é em memória desta religiosa.

Embora dando Graças a Deus por nos ter enviado o Sr. Pe Marcelino para substituir o Sr. Pe. Carlos Silva, ficámos tristes com a saída deste último. Ele nos marcou a todos pois, a partir do nada, com a Força do Espírito Santo, conseguiu reunir, em pouco tempo, uma grande comunidade.

Mas era preciso avançar. O mais difícil estava para fazer. Continuámos a tarefa de angariação de fundos para a construção daquela que viria a ser a nossa igreja.

Decorridos quase dois anos, e porque o salão polivalente da nova Igreja já estava em condições para acolher os fiéis e celebrar eucaristia, embora não totalmente terminado, foi aí que começaram a ser celebradas as missas e outras acções litúrgicas. Esta mudança aconteceu a 28 de Junho de 2003, dia da procissão em honra da Nossa Padroeira o “Imaculado Coração de Maria”, assim deixamos o velho salão de cinema. Para alegria de todos, a nossa procissão recolheu no salão da nossa futura igreja.

Tivemos a graça da presença do nosso Bispo D. Manuel Madureira Dias na procissão, que nos ajudou a dar graças a Deus por aquele momento, que tanto nos encheu a alma. Nesse dia, o Senhor Bispo, em nome da diocese, deu a sua oferta para ajudar a construção da igreja.

A partir desse dia, as eucaristias e celebrações passaram a realizar-se no salão, que apesar de estar em fase de acabamento oferecia melhores condições que o velhinho cinema.

A Câmara Municipal que tinha suportado as despesas com a estrutura do tosco da igreja, informou que embora existisse o compromisso inicial com o Protocolo assinado entre a igreja e aquela autarquia de financiar toda a construção não tinha possibilidades de o fazer a partir desta fase.

Não baixamos os braços. Sabíamos que a partir daquele momento iríamos depender da generosidade de todos os que estivessem dispostos a ajudar.

Continuámos as nossas iniciativas para angariação de fundos. Formamos uma comissão, cada elemento deste grupo dava a sua ideia e lá fomos continuando.

As obras de Deus são insondáveis! Com a Sua Graça, a generosidade das pessoas aumentou, as ofertas não paravam de chegar. Algumas pessoas, mesmo dependendo de uma pequena reforma, faziam questão de dar, por vezes, mais do que podiam.

Ficamos muito sensibilizados com a generosa oferta da Comunidade vizinha de Monte Gordo ao oferecer a receita do seu Bazar.

O passo a seguir, seria o acabamento da casa paroquial e das casas mortuárias pois era também uma das aspirações dos fiéis, pois, nessa altura, para poder velar os nossos defuntos era preciso nos deslocarmos até Castro Marim.

Acabado o salão, conseguimos por em marcha e concluir as casas mortuárias. A partir de 2004 passamos a ter a possibilidade de poder ali velar os nossos defuntos.

De seguida, porque as verbas não eram suficientes para dar continuidade aos trabalhos da nave principal da igreja, optou-se por concluir a casa paroquial e as salas de catequese, onde os custos seriam menores. Em Outubro de 2004 foi concluída a casa paroquial e as salas de catequese.

Embora esta fase fosse para nós uma grande conquista, era necessário continuar pois a parte mais ambicionada estava por fazer.

Depois de algumas hesitações o Senhor Padre Marcelino pediu a um construtor um orçamento apenas para a mão de obra para os trabalhos de conclusão da nave da nossa igreja. Nós tentaríamos arranjar quem nos oferecesse alguns materiais. Apesar de ter lançado a ideia, tinha a consciência que iríamos ter dificuldades, mas na verdade eu confiava no SENHOR.

Logo que tivemos o orçamento, decidimos avançar com os trabalhos. Contactámos, firmas, entidades públicas e privadas e apelámos como seria evidente a colaboração de todos.

Cada dia era uma bênção! Quando, ao fim de um dia, já não havia mais material para que os trabalhos continuassem no dia seguinte, bastava um telefonema e eles surgiam. Todos se prontificavam para oferecer materiais de construção ou ajudas monetárias, de facto era impressionante como tudo se resolvia.

Recordo que, um dia, no decorrer dos trabalhos, em que era preciso efectuar um pagamento de quase treze mil euros, mal cheguei ao meu local de trabalho, logo pela manhã, o Sr Padre Marcelino veio ter comigo com a cara de quem não tinha dormido, preocupado pois era preciso fazer o pagamento, nesse dia, do material para o chão.

Disse-lhe, para que não se preocupasse porque Deus providenciaria. Assim foi. Depois do Senhor padre ter ido embora, fiz alguns telefonemas. Nesse dia passei a minha hora de almoço a recolher alguns cheques. Com a ajuda de Jesus e sua Mãe Maria Santíssima, antes do fecho do banco, o dinheiro já lá estava. Então telefonei ao Senhor Padre a dizer-lhe que já podia efectuar o pagamento.

Tenho de salientar o empenhamento do nosso Pároco, o Sr Padre Marcelino, que para além das suas preocupações, muitas vezes, trabalhava juntamente com os pedreiros para que tudo caminhasse.

Apesar das dificuldades e preocupações, vivíamos na comunidade, todos unidos e rezando a Deus com o mesmo propósito e cada um conseguia graça, após graça.

No inicio do ano de 2005 os trabalhos estavam a caminhar a bom ritmo e quase no final, era preciso pensar no recheio para que pudéssemos fazer finalmente a mudança.

Decidimos arranjar ideias para conseguir o recheio para a nossa igreja. Tivemos a ideia de propor aos fiéis que se juntassem para comprar um banco, cada um custava quinhentos euros e eram precisos mais de trinta. A igreja é grande. As pessoas uniram-se em famílias ou em grupos. Cada grupo procurava amealhar para um banco. Assim conseguimos comprar os bancos, tivemos quem quisesse oferecer cinco bancos.

Era preciso muito mais que os bancos. Uma pessoa ou família ofereceu a mesa do Altar; outra, a Pia Baptismal; outra, o Sacrário. O mesmo aconteceu para o conjunto de alfaias para o altar, a toalha da mesa do altar, os castiçais, as Tábuas dos Dez Mandamentos (da frente do altar) e outros objectos necessários para o funcionamento da nova igreja.

A forma como surgiam as ofertas, por vezes, foi curiosa. Por vezes o apelo era feito em tom de brincadeira e, logo, as pessoas se dispunham a ajudar. Um dia fui comprar os vasos para as plantas. O diálogo com o comerciante foi do seguinte modo:

- Estes vasos quanto é que custam para mim?

- É tanto…. - respondeu o comerciante.

- E se eles forem para Nossa Senhora, quanto é que custam?

- Não gosto de padres e, por isso, o preço é o mesmo - respondeu o dono.

- Mas os vasos não são para o padre, são para a igreja. Se eu estivesse no seu lugar até os oferecia. E até tenho a certeza que quando você lá for, terá muito gosto e prazer em ver lá uma coisa que você ofereceu.

O homem não resistiu. Ofereceu os vasos.

Outra das muitas histórias curiosas foi a oferta do sino da nossa igreja.

Os trabalhos estavam quase a terminar. Nessa ocasião foi-me pedido que fosse aplicar um tratamento injectável a um residente de Altura porque tinha graves problemas de saúde e não podia deslocar-se ao centro de saúde, apesar de não ser enfermeira, mas com prática e experiencia para fazer esta tarefa. Ao terminar o tratamento o senhor perguntou-me quanto devia. Respondi que não era nada, pois nunca cobrei nada por tais serviços. Perante a sua insistência disse que, quando ele estivesse melhor, fosse à igreja agradecer a Deus pelas suas melhoras e, pelos meus préstimos, se isso o fizesse sentir-se bem, desse uma oferta para a igreja.

Em seguida pediu-me que lhe dissesse o que eu queria que ele oferecesse para a igreja. Na brincadeira e para o animar respondi:

- Não me pergunte, pois peço-lhe o sino. Acabamos de receber o orçamento.

- É isso mesmo que vou oferecer.

- Olhe que o valor é muito elevado - respondi.

-  Fica aqui prometido, diante da minha família, que irei oferecê-lo.

Passado pouco tempo, quis o Senhor chamá-lo a si, ainda antes da dedicação da igreja. Apesar disso, a família honrou a sua promessa, e fez com que na dedicação da nossa igreja o sino pudesse bater.

Concluídos os trabalhos e feitos os arranjos exteriores, pela Câmara Municipal, estava finalmente pronta a nossa igreja.

Assim, duma maneira simples, com o empenho de todos os irmãos da comunidade e de todos os que nos estenderam a mão com a sua generosidade, foi possível, no dia 11 de Junho do ano 2005, a dedicação da nossa igreja.

Tínhamos finalmente a nossa obra concluída, uma igreja com três naves, uma casa paroquial, um salão polivalente, cinco salas de catequese e duas casas mortuárias.

Foi, na realidade, um momento inesquecível para todos nós que vivemos histórias e aventuras sem fim, saborear este momento.

Esse caminho percorrido, por vezes com tempestades, ficará nas nossas memórias para sempre, e toda aquela vivencia, alegria e cumplicidade sempre muito unidos, foi espelhada nesse dia.

Todos resplandecíamos de alegria. O nosso Pároco, apesar das mãos gretadas e com o cansaço estampado no rosto, parecia uma criança ao receber o brinquedo que mais sonhara.

 Toda a comunidade se reuniu para esta Eucaristia tão especial, acompanhada do nosso Bispo D. Manuel Neto Quintas, o nosso Pároco, Pe. Marcelino, o Pe. Barbosa, superior provincial, o nosso anterior Pároco, o Pe Carlos Silva e muitos outros vindos de outras Dioceses e que também quiserem connosco viver esta alegria.

Após a Eucaristia, com a cerimónia da dedicação da nossa igreja, todos convivemos num lanche, organizado com a colaboração de toda a comunidade, onde partilhamos os momentos de alegria e de dificuldade vividos por cada um de nós ao longo desta caminhada. Foi na verdade, uma tarde muito feliz para todos.

Ao dar por concluída esta pequena história da caminhada da nossa comunidade, gostaria de pedir as maiores bênçãos de Jesus Cristo e Sua Mãe Maria Santíssima para todos os benfeitores desta obra, para todos os sacerdotes que nela se empenharam e, finalmente, para todos os que se deixaram usar como instrumentos de Deus, exercendo os seus talentos ao serviço do Senhor e desta comunidade.

Esta caminhada da nossa comunidade ensina-nos que a união faz a força e se nos entregarmos a Deus tudo é possível.

Hoje, dispomos de um templo digno de louvar a Deus, temos no entanto que continuar a construção do templo das pedras vivas que somos todos nós para edificação da verdadeira igreja de Cristo.

Também esta será possível, se caminharmos unidos a Jesus, com Sua Mãe Maria Santíssima, numa entrega total à vontade de Deus.